sexta-feira, 27 de junho de 2008

A Comunicação


Houve uma pessoa que comentou um post meu e que me levou a fazer uma pequena reflexão sobre a Comunicação. Etimologicamente a palavra vem do latim communicatio, que signfica romper o isolamento e praticar uma acção com outros, ou então, a acção de tornar algo comum a muitos. Vemos, por isso, que para existir a comunicação são necessárias pelo menos duas pessoas: uma que emite e outra que recebe.

No comentário ao meu post anterior uma das ideias avançadas é de que hoje em dia a comunicação se baseia somente em sons emitidos, e muitas vezes ruidosos, tendo o homem moderno perdido o contacto com outros tipos de linguagem mais subtil, como o olhar ou o gesto.

Na verdade acho que a coisa vai até mais longe, pois nos dias de hoje quase que já não há comunicação. Como é possível, podem perguntar? Simples, se eu falo algo e a outra pessoa percebe a ideia que emiti, a comunicação foi efectiva. Porém, se eu digo algo demasiado complexo ou a pessoa não entende o que emiti, então a comunicação não se efectuou. Grande parte da comunicação parte do facto de sabermos escutar, e refiro escutar, não ouvir. Para muita gente estas duas palavras são sinónimos, mas isso é ilusório: ouvir é um fenómeno fisiológico, ou seja, o ouvido humano tem certas características que lhe permitem captar uma certa gama de sons; escutar é um acto psicológico, pois manifesta-se no interesse e na consciência que a pessoa põe no assunto que está a ser emitido. Escutar implica perceber aquilo que está a ser transmitido e assimilá-lo.

No nosso quotidiano, porém, a maior parte das pessoas não sabe escutar os outros. Então, o que acontece são monólogos em que cada pessoa vai falando, mas sem escutar o que o outro diz: «Olá, há quanto tempo, o que tens feito?» /«Nada de especial, saí agora do trabalho e estou com muitos problemas lá, o meu chefe...» /«Ihhh! Olha, no meu também acontece cada coisa, nem te conto.» /«É que o chefe tem andado em cima de mim e não me deixa efectuar os trabalhos sem pressão, então tenho estado numa pilha de nervos.» /«Eu estou quase com uma depressão, até tenho andado a fumar mais e tudo.»

Esta é a comunicação que se faz hoje em dia, em que se transmitem somente queixas, aspectos superficiais, mas não se oferece aos outros (lembrar que comunicar vem de "tornar algo comum aos outros") o bom, o belo, o justo.

Aliás, muitas vezes as pessoas agridem os demais com vozes altas, com palavras brutas ou mesmo extremamente violentas. É constante vermos os condutores a gritar entre eles ou as pessoas a barafustarem nos transportes públicos. Isto tudo porque o ser humano perdeu o contacto com o seu interior, não vê o «outro lado do espelho» constatando somente a sua forma externa. Mas dentro de cada um de nós existe um mundo imenso onde uma série de processos vão acontecendo, onde coexistem aspectos bons e maus que merecem a sua devida atenção. Porém tudo isto é negligenciado e cultiva-se somente a forma externa. Eu diria que não existe «comunicação» interior e ao não existir as pessoas não sabem quem são, de onde vêm e para onde vão, não conhecem a sua verdadeira potencialidade bem como a sua natureza real. Vivem somente o presente e respondem somente aos impulsos do mundo exterior.

Chego à conclusão que para se saber efectivamente comunicar há que saber «comunicar» interiormente, só a partir daí é que o homem poderá ter contacto com a sua verdadeira identidade, aquilo que mora mais além do corpo físico e mais além das emoções: a sua Alma, o que de mais verdadeiro existe nele.

3 comentários:

Patricia disse...

Bonito artigo este da comunicação.
As relações tornam-se mais fertéis quando damos ao outro o melhor de nós, mas a simplicidade dos caminhos que procuramos hoje em dia não tem espaço para o mais profundo. Apenas para o mais árido e superficial...

Seshat disse...

Concordo com o que disse a pequenina. E o mais grave de tudo é que, se tentamos ser profundos, se confrontamos o outro com palavras vindas de num lugar bem mais real do que a máscara que alimenta a superficialidade, somos vistos como criaturas estranhas porque no mundo de hoje ninguém esta à espera de uma revelação, de um comentário que faça pensar. O inesperado tornou-se algo verdadeiramente assustador!

Richard Hermeticum disse...

Mas dentro de cada um de nós existe um mundo imenso onde uma série de processos vão acontecendo, onde coexistem aspectos bons e maus que merecem a sua devida atenção."

Acrescentava uma coisa a essa ideia. É que esse mundo interior, embora seja interno não é exclusivamente nosso. Alias, o Ideal de Fraternidade parte precisamente desse principio.

Bom post.