O primeiro pensamento que pode vir à cabeça de muita gente é: «pode existir uma relação entre estes dois elementos?». E eu respondo: «Sim, pode.»
Para isso teremos que entender os conceitos. Em primeiro lugar: Filosofia. A primeira vez em que se pronunciou a palavra «filósofo» aconteceu na Grécia, pela boca de Pitágoras. Antes dele, aqueles que buscavam o conhecimento, que se questionavam sobre as leis naturais, a origem do universo, etc., eram chamados de «sophos» - sábios -. Eles, de facto, possuíam muita sabedoria, porém essa mesma sabedoria era um pouco complexa, pelo que era de difícil compreensão para a grande maioria das pessoas. Podemos encontrar um exemplo destes sábios em Parménides, Anaximandro, Anaxímenes ou Demócrito.
Pitágoras procurou realizar as coisas de um modo diferente. Ele quis tornar o conhecimento mais acessível ao povo, pois este também tinha questões para as quais não encontrava resposta. Um dia, quando questionado sobre se seria um sábio ele respondeu que não era, sendo antes um «philo sophos», ou seja, um amigo ou enamorado da sabedoria.
Quando qualquer ser humano ama alguém realiza todos os esforços para poder estar com a pessoa amada. Do mesmo modo, o filósofo procura alcançar a Sabedoria, não se poupando a esforços para ultrapassar os obstáculos que possam impedi-lo de alcançar o seu objectivo.
Filosofia seria, então, Amor à Sabedoria e está longe de ser essa disciplina teórica, que somente questiona sem encontrar soluções para os problemas. Não! A Filosofia questiona, mas com sentido, com uma finalidade e esse objectivo é eminentemente prático. E o primeiro elemento prático que a Filosofia nos proporciona é o conhecimento de nós próprios, da nossa natureza, dos nossos defeitos, virtudes e potencialidades.
O ser humano é uma caixa de surpresas, pois no seu interior existem vários elementos que nem ele próprio conhece. Daí a importância da Filosofia, pois ela proporciona os meios para que o homem rompa o véu que tolda a sua visão e, assim, consiga ver aquilo que realmente é e, deste modo, depois de constatar as suas potencialidades, as consiga transformar em actos, em concretizações.
E é aí que entra a Vocação. Etimologicamente a palavra deriva do latim «vocare» que quer dizer «chamado» ou «convocação». Mas esta chamada não está relacionada com uma profissão, mas sim com algo superior: a plena realização da natureza do indivíduo. Assim, aquele que consegue actuar dentro da sua vocação e trabalha com aquilo que faz parte da sua natureza encontra a sua realização e, consequentemente, a felicidade na vida.
Nesse sentido, deixo uma frase do célebre filósofo chinês Confúcio, que dedicou uma grande parte dos ensinamentos ao desenvolvimento do ser humano: «Escolhe um trabalho que ames e não terás que trabalhar um único dia da tua vida.» Para o pensamento chinês, se um indivíduo conseguisse manifestar o seu potencial naquilo que fazia e que a sua acção beneficiasse não só a ele, mas também a tudo em seu redor, ele teria encontrado a sua via (o Tao, a via realizante propagada na China antiga).
Assim sendo, o mais importante para o homem não é procurar um emprego que proporcione fama, riqueza ou honrarias, mas sim um para o qual tenha uma propensão, onde possa realizar-se verdadeiramente como indivíduo e manifestando qualidades como inteligência, perseverança, vontade, discernimento, memória, atenção, etc., elementos que moram no interior de cada um, mas que, nos dias que correm, raramente são bem explorados.
Vocação não é possível sem Filosofia, pois não existe a possibilidade de atendermos a um chamado da nossa natureza se não soubermos quem somos na realidade. E para descobrimos isso há que ter sempre presente o conselho que o grande filósofo grego, Sócrates, transmitia aos seus discípulos: «CONHECE-TE A TI MESMO.»